Já tínhamos passado alguns dias com os guardas florestais da Reserva Nacional do Niassa em Moçambique, patrulhando a área com viaturas 4x4, em estradas de terra e fazendo longas caminhadas no meio do mato em uma operação de comando quase silenciosa. Durante uma pausa nom dos postos avançados, me pediram para explicar porque que eu, cineasta do Global Wildlife Program (GWP), estava a fazer vídeos sobre eles e como eu me sentia lá.
O que eu poderia dizer a esse grupo de intrépidos guardas florestais que me olhavam com uma mistura de empatia e confusão, perguntando-se o que estava eu a fazer na reserva, equipado apenas com uma câmara de vídeo? Especialmente quando me contaram histórias sobre como todas as vezes que estavam em patrulha existia o risco de enfrentarem perigos mortais como cobras e mambas negras letais, ou serem atacados por búfalos e elefantes, e o pior - enfrentar caçadores furtivos armados com AK-47 e apoiados por sofisticados sindicatos envolvidos no tráfico da vida selvagem, com muito recursos disponíveis.
Eu tenho estado a cobrir guerras e conflitos desde 2000, quando fui integrado como jornalista dos fuzileiros navais dos EUA, no Afeganistão, para documentar a revolução da Líbia, entre outros. Mas a guerra para proteger os elefantes e a vida selvagem desenvolve-se em outro tipo de campo de batalha. Neste conflito, conseguimos sentir o perigo e a tensão, mas não conseguimos prever um encontro com caçadores furtivos ou quando a situação se pode tornar explosiva. O inimigo pode até estar ao nosso lado - incorporado nas forças policiais, no governo, autoridades portuárias, moradores locais, entre outros. Apesar de ser uma força paramilitar, os guardas florestais raramente estão suficientemente bem equipados para confrontos armados com caçadores furtivos equipados com armas e munições de guerra.
É uma corrida contra o tempo. Nos últimos sete anos, as estatísticas do governo mostram que os caçadores furtivos mataram metade dos elefantes de Moçambique. Restam apenas 10.000. Como chefe dos guardas florestais do Niassa, José Sitoe explicou-me que se a atual ameaça contra os elefantes continuar, eles estarão em perigo de extinção.
As vidas dos guardas florestais também estão em perigo constante. Pelo menos 100 guardas florestais morrem todos os anos para proteger os parques e a vida selvagem - uma média de dois por semana, de acordo com a Federação Internacional dos Guardas Florestais e a Fundação Thin Green Line, que monitora essas estatísticas desde 2009. Além das preocupações óbvias com a segurança, os guardas florestais na Ásia e África também enfrentam grandes riscos de saúde e doenças infeciosas, de acordo com a maior e mais abrangente pesquisa sobre o bem-estar dos guardas florestais, divulgada no mês passado pela World Wildlife Fund (WWF). A pesquisa também demonstra que os guardas florestais lutam com as necessidades básicas de bem-estar como abrigo e água limpa, enfrentam “lacunas gritantes” na formação e melhoria de competências, “equipamentos de comunicação inadequados, falta de transportes, baixos salários e incapacidade de responder às táticas sempre em evolução utilizada pelos caçadores furtivos."
Ao longo dos 10 dias que passei com os guardas florestais, eles passaram-me a sua própria e extensa lista de desafios, incluindo poucos homens, muitas vezes mal equipados, para cobrir enormes extensões de terreno, número de insuficiente de veículos e a incapacidade de lidar rapidamente com ameaças iminentes. Também enumeraram algumas necessidades mais básicas, como melhor comida e mais cobertores.
Ao mesmo tempo, pude ver o compromisso, coragem e bravura desses homens. Consegui sentir a sua raiva e tristeza quando me contaram histórias sobre os elefantes mortos que já encontraram, ou quando perseguiram caçadores furtivos que conseguiram escapar. Apesar das patrulhas constantes no que poderia tornar-se um território hostil, a maioria dos guardas florestais com quem conversei tinha, como me disse o chefe de operações Sebastião Saize, “a conservação nos seus corações e um grande amor pela natureza”.
Todos esses homens têm famílias, esposas e filhos que ficam preocupados com eles cada vez que saem de casa com a farda nos seus sacos a caminho do acampamento base dos guardas florestais, ausentando-se por vários meses. Eu consegui sentir pelas expressões nos seus rostos que o seu trabalho intenso e desafiador não é adequadamente ou frequentemente reconhecido.
Ainda assim, em uma das áreas mais difíceis e rudes para se ser um guarda florestal, com poucos recursos, este grupo de guardas florestais dedicados deseja que os seus filhos e netos tenham a oportunidade de verem os elefantes selvagens no Niassa.
Finalmente, tinha uma resposta.
Disse-lhes que sabia que a defesa dos elefantes pode ser um trabalho difícil e ingrato, assim como a luta contra os caçadores furtivos - quando existem interesses maiores no poder e máfias internacionais com os seus tentáculos em todo o lado, não apenas no Niassa, mas em todo o mundo. Disse-lhes como os vi em patrulha e como se preocupam, como ficam frustrados quando não conseguem fazer o seu trabalho adequadamente devido às adversidades que não têm nada a ver com a sua vontade e competências. É por isso que é importante contar a vossa história, disse-lhe, para mostrar a toda a gentes que estão a pôr as vossas vidas em risco para salvar os elefantes, fazendo a diferença para a natureza e para o futuro de Moçambique.
Niassa Elephant Defenders (Os defensores dos elefantes do Niassa) é o sétimo vídeo criado para o Global Wildlife Program (GWP), obra do premiado cineasta, jornalista e fotógrafo Raul Gallego Abellan. Pode ver os outros vídeos - filmados no Gabão, em Moçambique e no Vietname- nosite da GWP. O Raúl acabou de voltar de filmagens no Malawi e na Zâmbia para o GWP.
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