Publicado em Africa Can End Poverty

Moçambique precisa de um novo modelo de crescimento para um desenvolvimento sustentável e inclusivo

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Moçambique registou um rápido crescimento económico ao longo de duas décadas, de 1993 a 2015. Durante este período, o crescimento do país, que foi sobretudo impulsionado pela indústria extractiva e o investimento público, atingiu uma média anual de 7,9% e situou-se entre os mais altos da África Subsariana (ASS).

A revelação de dívidas não declaradas em 2016, coloquialmente conhecidas por “dívida oculta”, levou a uma descida abrupta do crescimento, provocando uma crise de governação económica e um abrandamento económico prolongado, com o crescimento a cair para 3% em 2016-2019. O abrandamento do crescimento foi ainda exacerbado pelos efeitos combinados de desastres naturais em 2019, a escalada da insurreição no Norte de Moçambique desde 2017 e a pandemia global da COVID-19 a partir de 2020.

A estratégia em vigor para o crescimento de Moçambique tem tido uma capacidade limitada para gerar empregos produtivos e apoiar uma redução acelerada da pobreza. Quase dois terços da população vivem na pobreza e o país está entre os mais desiguais da ASS. Tal resulta, em parte, da maior dependência de Moçambique aos grandes projectos no sector extractivo, com poucas interligações com o resto da economia e uma agricultura de baixa produtividade. Há uma necessidade urgente de criar empregos para as 500 mil pessoas que entram no mercado de trabalho todos os anos.

A recente descoberta de algumas das maiores reservas de gás natural (GNL) do mundo podia representar uma oportunidade única de um crescimento sustentado e inclusivo para Moçambique. No entanto, para se tirar o maior proveito dos recursos esperados do GNL e fazer chegar aos pobres esse crescimento será necessário um novo e ambicioso modelo de crescimento que vá para além das indústrias extractivas. O último Memorando Económico  de Moçambique (CEM), Relançar o Crescimento para Todos fornece recomendações concretas para este modelo de crescimento que pode ser resumido em dois pontos principais: fazer o melhor uso possível das receitas dos recursos naturais não renováveis e promover o crescimento em sectores não extractivos, acompanhado de uma transformação espacial e de maior produtividade agrícola.   

Moçambique precisa de adoptar um quadro político e institucional adequado antes das receitas inesperadas do sector do GNL. Um quadro orçamental que funcione correctamente (incluindo regras e objectivos orçamentais claros) é essencial para uma gestão bem-sucedida destas receitas voláteis no futuro. Um fundo soberano (SWF) bem gerido pode ajudar a alcançar estabilização a curto prazo e poupanças de longo prazo para as gerações futuras. Uma gestão macroeconómica prudente envolveria também um aumento gradual do investimento que tenha em consideração a limitada capacidade de absorção e melhore simultaneamente a qualidade dos investimentos públicos.  

Para além de se maximizar a receita do GNL, é essencial incentivar o crescimento em sectores não extractivos para promover um crescimento económico de base alargada. Numa primeira fase, as políticas deverão ser orientadas para a maximização dos benefícios do crescimento movido pelos recursos. Para tal, seria necessário reforçar as interligações entre as indústrias extractivas e o resto da economia e aumentar as ligações intersectoriais. É fundamental para a transformação económica e a criação de empregos, uma maior participação do sector privado, incluindo no sector dos serviços. O sector privado poderia tornar-se um motor da transformação económica e da criação de emprego mas há vários constrangimentos que o impedem, incluindo os quadros regulamentar e de governação.  

Moçambique podia aumentar o sector de serviços, em dimensão e sofisticação. Os serviços de base – tais como telecomunições e transportes e logística – têm potencialidade para promover o crescimento noutras actividades orientadas para as exportações, incluindo agronegócios e mineração. Será necessário, para o efeito, apoiar um comércio aberto e um regime de investimento com um quadro regulamentar transparente e eficaz. O quadro de governação pouco sólido está a impedir reformas regulamentares, necessárias para o crescimento do sector dos serviços, enquanto a corrupção é mencionada pelas empresas moçambicanas como um dos três principais obstáculos às suas operações.

A promoção de um crescimento mais inclusivo irá necessitar de esforços adicionais para desenvolver a produtividade agrícola e aumentar a mobilidade rural com vista a ligar os agricultores aos mercados e a oportunidades não agrícolas. As políticas deveriam apoiar o acesso aos principais corredores e mercados, a adopção de sementes de melhor qualidade e fertilizantes. É ainda crucial criar resiliência aos riscos climáticos com a expansão da cobertura das redes de segurança, o aumento da disponibilidade de sistemas de avisos meteorológicos e o desenvolvimento de mecanismos de transferência de riscos.


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