Publicado em Digital Transformation

Reduzindo a exclusão digital do Brasil: como a desigualdade de acesso à internet reflete as disparidades de renda

Esta página em:
Reduzindo a exclusão digital do Brasil: como a desigualdade de acesso à internet reflete as disparidades de renda © Shutterstock

Em toda a América Latina, a exclusão digital não é apenas uma questão tecnológica, mas um reflexo explícito da desigualdade de renda. O Brasil não é exceção. O acesso à internet, uma porta de entrada crucial para a educação, oportunidades de emprego e serviços essenciais, continua a ser distribuído de modo desigual. A pesquisa destaca uma disparidade significativa -  indivíduos mais ricos geralmente desfrutam de conectividade contínua, enquanto as populações mais pobres muitas vezes lutam com acesso limitado ou nenhum, perpetuando as divisões socioeconômicas e impedindo o desenvolvimento regional.

Para aprofundar o nexo entre desigualdade financeira e acesso à internet, realizamos um estudo em seis grandes cidades brasileiras – Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza, Manaus, Rio de Janeiro e São Paulo. O objetivo foi examinar como a velocidade da Internet evoluiu ao longo do tempo e do espaço nessas cidades, e como tal evolução pode estar ligada a dimensões socioeconômicas e desigualdades pré-existentes.

O estudo rastreou as velocidades da internet móvel e fixa nessas cidades de 2017 a 2023 usando dados de quase 100 milhões de medições geolocalizadas providas pela Ookla® Speedtest Intelligence®. Não foi surpresa ver que os bairros mais ricos desfrutavam consistentemente de velocidades superiores de Internet, especialmente em redes fixas (Fig. 1A). Embora a velocidade da Internet móvel também se correlacione com a riqueza, a tendência tem diminuído ao longo do tempo, provavelmente devido à maior cobertura de rede móvel e atualizações de infraestrutura, como a mudança para 4G e 5G (Fig1B).

Figura 1: Correlação entre a velocidade da internet fixa (a) e móvel (b) e uma proxy de renda em diferentes cidades

 Image

 

Um aspecto do estudo que demonstrou alta precisão diz respeito ao exame da velocidade da internet no entorno das instalações educacionais em 2023. Surpreendentemente, cerca de 13% dessas áreas tinham velocidades abaixo do limite de 80 Mbps, o que é necessário para um e-learning eficaz. Tal condição afetou cerca de 8% da população em idade escolar. As disparidades eram notáveis entre as cidades, com Belo Horizonte tendo o melhor desempenho e o Rio de Janeiro sendo o menor. No Rio de Janeiro, também descobrimos que as favelas geralmente exibem velocidades de internet mais baixas em comparação com o resto da cidade, uma disparidade que aumentou ao longo dos anos.

Essa análise ressalta as persistentes desigualdades de acesso à Internet no Brasil, um país com um cenário digital muito diversificado. Enquanto o acesso à banda larga em alguns Estados, como Santa Catarina, supera alguns países da OCDE , outros, como Acre, Amazonas e Maranhão, ficam significativamente para trás.

Apesar dos investimentos substanciais - cerca de US$ 28 bilhões desde 2020 - no setor de telecomunicações do Brasil, os esforços ficaram aquém de garantir acesso equitativo à internet. O estudo revela que as populações mais pobres ainda lidam com uma conectividade mais lenta em comparação com as contrapartes mais ricas – uma lacuna que aumenta durante crises. De fato, após a declaração de emergência nacional devido à pandemia de COVID-19, todas as cidades registraram diminuição na velocidade da internet (Figura 2), mas as áreas mais pobres tiveram quedas maiores na velocidade.                                                                                 

Figura 2: Evolução da velocidade de download da internet fixa (linha azul) e % de indivíduos que ficaram em casa (linha laranja) no Rio de Janeiro.

Então, o que podemos fazer em relação a essas disparidades? Está claro que os formuladores de políticas e o setor privado podem colaborar com políticas locais direcionadas. São necessárias iniciativas que se concentrem em melhorar a conectividade em áreas carentes, promover o Fiber to the Home (FTTH), uma tecnologia de banda larga que usa fibra ótica para fornecer internet de alta velocidade mais rápida e confiável diretamente às residências, tornando pacotes e dispositivos de internet de alta velocidade mais acessíveis e promovendo a alfabetização digital por meio de programas de treinamento e conscientização. Por exemplo, o Banco Mundial está apoiando o Estado de Sergipe a conectar cerca de 1.000 edifícios públicos com fibra óptica, catalisando investimentos do setor privado para levar acesso à internet a residências desconectadas.

Com a implementação dessas medidas, podemos trabalhar para um acesso mais equitativo à internet, no Brasil, mas também em todo o mundo. Isso ajudará a garantir que todos tenham acesso a conectividade rápida, acessível e confiável — uma pedra angular do desenvolvimento na era digital.

Nota: A pesquisa apresentada neste blog foi apoiada pelo Fundo Fiduciário de Parceria para o Desenvolvimento Digital.


Niccolò Comini

Digital Development Specialist, World Bank Digital Development Global Department

Nicolò Gozzi

Senior Research Scientist at ISI Foundation

Juntar-se à conversa

The content of this field is kept private and will not be shown publicly
Remaining characters: 1000