COVID-19 e a crise de aprendizagem na América Latina e no Caribe: Como podemos prevenir uma tragédia?

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Perder um ano inteiro de estudos pode significar a diferença entre um futuro brilhante e uma vida mais difícil. É o que está acontecendo com milhões de crianças na América Latina. Esperanças e sonhos de uma vida melhor podem ser estraçalhados para sempre - a menos que ajamos agora. 

Enfrentamos atualmente a maior crise já vista para a educação na América Latina e no Caribe (ALC). A maioria das escolas está fechada há quase um ano por causa da COVID-19. Já podemos ver os danos em termos de resultados educacionais, capital humano e produtividade de uma geração inteira. 

Primeiro, vamos examinar os danos e, em seguida, voltar à questão mais urgente: O que precisamos fazer para evitar que esta crise se transforme em uma tragédia? 

Até fevereiro de 2021, cerca de 120 milhões de crianças em idade escolar da região já haviam perdido ou corriam o risco de perder um ano letivo inteiro de educação presencial devido às medidas para conter a pandemia, de acordo com um novo relatório do Banco Mundial “Agindo Agora para Proteger o Capital Humano das Nossas Crianças: Os Custos e a Resposta ao Impacto da Pandemia de COVID-19 no Setor de Educação na América Latina e Caribe”, com resumo em Português aqui

E embora os governos tenham procurado alcançar esses alunos por meio de aulas online e de outras soluções remotas multimodais, muitos estão simplesmente fora do alcance dos esforços das redes de educação. As escolas e as famílias muitas vezes não estavam prontas para fazer a transição. Por exemplo, apenas cerca de 77% dos alunos de 15 anos na ALC têm acesso à Internet em casa, e esse desafio tem sido muito maior para os grupos desfavorecidos. No Peru, México, Panamá e Colômbia, por exemplo, apenas 14, 19, 24 e 25 por cento dos alunos no quintil inferior de renda têm acesso à Internet em casa, respectivamente.

O impacto esperado da pandemia no aprendizado e em outros resultados da educação é impressionante e tremendamente desigual. A América Latina e o Caribe enfrentavam uma crise de aprendizado antes mesmo da pandemia. A Pobreza de Aprendizagem - definida como a porcentagem de crianças de 10 anos que não conseguem ler e entender um texto simples - já era muito alta, 51% na região. Além disso, a região já tinha a maior desigualdade do mundo no acesso dos alunos à educação de qualidade. Por exemplo, no Brasil, a Pobreza no Aprendizado no estado de São Paulo era de 27%, enquanto alcançava 70% no estado do Maranhão.

A pandemia só piora as coisas. Pelo menos 15% dos alunos podem nunca mais voltar para a escola. As perdas de aprendizagem provavelmente serão substancialmente maiores para as crianças no quintil de renda mais baixa, ampliando a já elevada lacuna de desempenho educacional socioeconômico em 12%. A reabertura antecipada das escolas privadas em relação às escolas públicas em alguns países está apenas contribuindo para esse aumento.

Embora as coisas estivessem ruins antes, elas podem ficar muito piores, a menos que façamos algo a respeito agora. A Pobreza de Aprendizagem pode aumentar em mais de 20% - de uma linha de base de 51%, até 62,5%, equivalente a um aumento de aproximadamente 7,6 milhões de crianças com pobreza de aprendizagem. Após 10 meses de fechamento das escolas (todo o ano letivo), mais de 2 em cada 3 alunos no fim dos anos iniciais do Ensino Fundamental (71%) podem não ser capazes de entender um texto de tamanho moderado, em comparação com 55% antes da pandemia. Isso poderia aumentar para 77% se as escolas permanecerem fechadas por mais três meses no início do ano letivo de 2021.

Esses resultados também têm custos diretos, tanto para o potencial individual dos alunos quanto para a produtividade futura de seus países. Por exemplo, as perdas de aprendizagem podem se traduzir em uma queda nos ganhos agregados de renda potenciais para a região de US$ 1,7 trilhão, cerca de 10% dos ganhos básicos totais e equivalente a cerca de 16% do PIB regional.

Além de tudo isso, as dificuldades econômicas para as famílias e a interrupção dos serviços que os alunos recebiam nas escolas - incluindo refeições para 10 milhões de alunos na região - estão prejudicando a saúde física, mental e emocional dos alunos.

Os governos e todos os envolvidos na educação de nossa região precisam agir agora para mitigar os danos, investindo para se recuperar das enormes perdas de aprendizagem e aproveitando a oportunidade de mudança para construir melhores sistemas de educação para nossas crianças.

Isso significa se preparar para a reabertura segura e eficaz da escola em todo o país e garantir que financiamento suficiente seja alocado para isso. Então o que fazer?

  • As escolas podem implementar com sucesso protocolos de saúde e higiene apropriados ao contexto.  
  • Os professores podem ser classificados como trabalhadores da linha de frente e priorizados no processo de vacinação.
  • Os calendários escolares devem ser modificados e os currículos priorizados, definindo metas de recuperação da aprendizagem e objetivos mínimos de aprendizagem para 2021 e 2022.
  • Os professores devem receber ferramentas para identificar efetivamente onde cada criança está em termos de desempenho de aprendizagem. O aprendizado do aluno corresponde ao que ele deveria ter aprendido três meses atrás? Seis meses atrás? Um ano atrás?
  • A adoção de estratégias eficazes e escalonáveis ​​para o ensino de nível adequado, incluindo, conforme necessário, programas de recuperação, durante e depois do horário escolar.
  • Professores e diretores precisarão ser apoiados para obter as habilidades necessárias para otimizar a alternância de atividades presenciais e remotas.

Embora os desafios sejam enormes, o potencial também é enorme para reconstruir sistemas educacionais ainda melhores do que antes. A pandemia abre uma janela de oportunidade única para: a) investimentos ​​em tecnologia, que já deveria ter acontecido para eliminar a exclusão digital; b) investimento nos professores, na profissionalização de suas carreiras e nas ferramentas de que precisam para cumprir seus papéis cada vez mais complexos; e c) apoio ao papel dos pais e da comunidade no processo educacional. Isso pode acontecer mais rápido e melhor (algumas barreiras mentais em relação à capacidade dos professores de se adaptarem às novas tecnologias agora são menores, por exemplo). Esses investimentos devem fazer parte da resposta imediata. Nosso desafio crítico de política pública é garantir que essa janela de oportunidade não seja perdida, e os países usem essa crise momentânea como A oportunidade de começar a virar o jogo para vencer a crise de aprendizagem.

A COVID-19 pode ser uma oportunidade para transformar os sistemas de educação e desenvolver uma nova visão em que a aprendizagem aconteça para todos, em qualquer lugar. Mas isso requer priorização de investimentos financeiros em educação e grande vontade política. O futuro depende de nós fazermos isso bem. 


Autores

Jaime Saavedra

Human Development Director for Latin America and the Caribbean at the World Bank

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