A grilagem — ou seja, a invasão de lotes de terra para, em seguida, desmatá-los e reivindicar sua posse — ocorre no Brasil desde os tempos coloniais. É o que os colonos faziam para povoar rapidamente o país e elevar ao máximo a área usada para a produção. Há muito tempo, essa prática é associada à ilegalidade: o termo grilagem vem de grilo, supostamente porque escrituras falsificadas costumavam ser colocadas em gavetas com grilos para que adquirissem um aspecto envelhecido e mais autêntico, antes de serem apresentadas às autoridades.
A grilagem é um dos principais vetores do desmatamento na Amazônia brasileira, especialmente nas áreas em que os direitos fundiários são mais precários. As terras públicas não destinadas são especialmente vulneráveis: apesar de cobrirem cerca de um décimo da Amazônia, concentram um quarto de seu desmatamento total. Embora a grilagem seja um fenômeno comum em regiões de fronteira ao redor do mundo, e apesar de seu impacto no desmatamento ser bem documentado, a replicação da experiência global de expansão de fronteiras na Amazônia pode vir a gerar danos ambientais e econômicos permanentes, dada a biodiversidade excepcionalmente valiosa da região, seu papel no armazenamento de carbono, sua importância para regular as chuvas em toda a América do Sul e o risco iminente de pontos de inflexão.
Nossa experiência indica que, quando são instituídos mecanismos apropriados de monitoramento e fiscalização, o fortalecimento da governança fundiária por meio da conversão de terras não destinadas em áreas protegidas pode ser uma maneira eficaz de conter o desmatamento. No entanto, o custo político de fortalecer o status de proteção ambiental das terras amazônicas é alto, e as proteções em vigor são, em alguns casos, removidas para gerar ganhos políticos. Mesmo quando o monitoramento é robusto e a fiscalização, eficaz, outras forças podem limitar o impacto de boas políticas de manejo territorial e florestal. Isso ocorre porque a grilagem de terras é lucrativa e, assim como outras atividades ilegais que ocorrem na Amazônia, é difícil impedi-la enquanto a demanda por terras permanecer alta.
A demanda por terras na região está intimamente ligada à rentabilidade das atividades agrícolas. Estudos recentes indicam que os preços da terra no Brasil têm uma correlação positiva com a taxa de câmbio efetiva real — uma medida da competitividade externa do país. Isso é algo intuitivo: a agricultura é o maior setor de exportação do Brasil, e, quando a competitividade externa aumenta, os agricultores querem produzir mais. O aumento da demanda por terras faz com que os preços subam; e, para compensar esses aumentos, os agricultores muitas vezes recorrem ao desmatamento.
De fato, a taxa de câmbio está mais correlacionada ao desmatamento que aos preços da terra, o que parece indicar que a incorporação de mais terras seja algo relativamente fácil. Essa é uma característica comum das regiões de fronteira e um facilitador do desmatamento. Nesse sentido, a grilagem de terras e a vasta destruição de capital natural associada ao desmatamento são características inerentes à economia das fronteiras agrícolas. Isso só pode ser interrompido definitivamente se, juntamente com o monitoramento e a fiscalização, também forem alterados os incentivos econômicos para a incorporação de mais terras.
Tirar os grileiros do mercado, promovendo o desenvolvimento
A eliminação dos incentivos que levam os grileiros a querer incorporar mais terras requer uma combinação de políticas que influenciem tanto a oferta quanto a demanda por terras.
Do lado da oferta, é importante implementar políticas que reduzam as terras disponíveis para grilagem. Destinar florestas públicas como áreas protegidas (terras indígenas ou unidades de conservação), melhorar o monitoramento das áreas protegidas e punir indivíduos que pratiquem desmatamento ilegal são maneiras de se “fechar a fronteira”, aumentando os custos da grilagem na Amazônia. De fato, tais políticas ajudaram o Brasil a reduzir a grilagem e a violência associada a esse fenômeno nos anos 2000.
Do lado da demanda, é importante promover um modelo econômico menos dependente de atividades fundiárias na região, a fim de reduzir a demanda por terras e, portanto, os incentivos à grilagem. A demanda por terras na Amazônia está intimamente ligada à pecuária de baixa produtividade. Essa atividade só é lucrativa quando a terra, o capital e a mão-de-obra são baratos. Não surpreende o fato de um a maior demanda por mão de obra e capital muitas vezes afastar a pecuária de baixa produtividade e reduzir o desmatamento. Portanto, aumentar a produtividade e, assim, aumentar a demanda por mão de obra e capital em outros setores é uma medida fundamental para reduzir a demanda por terras e tirar os grileiros do mercado.
A implementação de um modelo econômico menos dependente de atividades baseadas na terra é fundamental para aumentar a produtividade. Tal modelo exigirá um foco maior na produtividade em setores urbanos em todo o Brasil, e a promoção de atividades urbanas relativamente descoladas da floresta — dentro e fora da Amazônia — contribuiria para tirar do mercado pecuaristas de baixa produtividade, reduzindo a demanda por terras e os incentivos à grilagem. Além disso, o aumento da produtividade nas regiões agrícolas mais consolidadas do Brasil também poderia reduzir a pressão sobre as terras amazônicas e, ao mesmo tempo, atender à demanda global de alimentos. Esse aumento de produtividade nas áreas urbanas, embora crucial, levará tempo. Para as necessidades mais urgentes de conservação, a eficácia do monitoramento e da fiscalização permanecerá fundamental, acompanhada por diversos passos rumo à alteração da produtividade urbana no médio prazo.
Promover essas estratégias de oferta e demanda com foco em resultados de curto e médio prazos é fundamental para que possamos criar uma rota de desenvolvimento na Amazônia que concilie floresta em pé, respeito às leis e aumento da renda.
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