Alguns meses atrás, antes da pandemia do COVID-19 (coronavírus) virar o mundo de cabeça para baixo, visitamos Amelia e suas amigas Maria e Amelia na aldeia de Nhamiambe, distrito de Marromeu, na província central de Moçambique, Sofala. Elas estavam empolgadas; aos 12 e 13 anos, estavam saindo de casa pela primeira vez para fazer algo que muitas raparigas nas aldeias rurais de Moçambique só podem sonhar: concluir o ensino médio.
Com o apoio do Projecto das Áreas de Conservação para Biodiversidade e Desenvolvimento, do Banco Mundial (MozBio), as raparigas - juntamente com outras 27 meninas de distritos vizinhos ao redor da Reserva Nacional Marromeu - viajaram para a cidade de Caia, a mais de 100 quilômetros de distância. Quando visitamos elas, algumas semanas antes da partida, também conhecemos os pais e, apesar da inevitável tristeza de despedida, as famílias eram só sorrisos. Essa oportunidade estava além de tudo o que eles poderiam esperar de suas filhas.
Embora ninguém diga explicitamente qual outro caminho eles esperavam para as meninas, a realidade é clara. Poucos dias antes de Amelia e suas amigas partirem para Caia, uma das outras raparigas selecionadas para o programa de bolsas desistiu quando seus pais a casaram. Abandono escolar e gravidez na adolescência são uma realidade comum para muitas jovens mulheres e meninas na zona rural de Moçambique, onde o casamento prematuro é generalizado e frequentemente visto como uma maneira da família ganhar um dinheiro extra.
Avançando para junho de 2020, as meninas se encontram em uma realidade diferente, ou devemos dizer, familiar. No final de março, os primeiros casos do COVID-19 foram confirmados em Moçambique e um estado nacional de emergência foi declarado, fechando escolas em todo o país. As raparigas tiveram que deixar o internato e retornar às suas aldeias.
Se você acha que o ensino em casa é um grande desafio, tente fazê-lo em Nhambine! Aqui, as aulas são realizadas através das rádios comunitárias, pelo menos em alguns dias da semana. As tarefas e os trabalhos de casa ainda são abundantes, e é difícil para as meninas acompanharem, especialmente quando não podem trabalhar em grupos, como gostavam de fazer no internato. No entanto, com a ajuda de oficiais comunitários da Reserva Nacional de Marromeu e de professores que moram em sua aldeia, eles conseguem acompanhar.
No todo, o projecto MozBio apoia 67 meninas com bolsas de estudo e acomodações em torno da Reserva Especial de Maputo, Reserva Nacional de Chimanimani e Marromeu. O projecto também está a ajudar 60 escolas localizadas nessas áreas a implantar a educação ambiental como parte do currículo, visando aumentar a conscientização e o envolvimento dos jovens na preservação da preciosa biodiversidade e dos recursos naturais de Moçambique. Em cada escola, o projecto também criou clubes de raparigas e jovens que fornecem orientação para aprimorar habilidades de leitura, escrita e numeração, além de servir como uma plataforma para se obter conhecimentos seguros sobre a saúde reprodutiva das meninas e meninos.
Aumentar o acesso das raparigas à educação e capacitar as mulheres se tornou uma área de intervenção central do Portfolio de Gestão Integrada da Paisagem (ILM) de Moçambique, o qual o MozBio faz parte. Os recursos naturais de Moçambique e suas Áreas de Conservação, que cobrem 25% do país, não existem isoladamente - eles coexistem com as comunidades. Para alcançar nossos objetivos ambientais e ter um impacto duradouro, é necessário abordar dinâmicas interligadas de altas taxas de analfabetismo, baixa renda, degradação ambiental e desigualdade de gênero no acesso e uso dos recursos naturais.
Para expandir a capacidade de resposta de gênero dentro do portfólio ILM, recentemente foi concluída uma análise sobre as disparidades de gênero e plano de ação para o portfólio. O plano visa fornecer orientações sobre como os projectos de gestão de recursos naturais podem abordar manifestações comuns da desigualdade de gênero que limitam o desenvolvimento das mulheres, seu potencial de gerar riqueza para suas famílias, comunidades, para a economia como um todo e sua participação na gestão dos recursos naturais. Além de intervenções para aumentar a participação das mulheres em cadeias de valor sustentáveis, o plano enfatiza fortemente o envolvimento de homens e rapazes e a abordagem da desigualdade de gênero em nível familiar.
A abordagem é feita através do Sistema de Aprendizagem de Acção de Gênero (GALS) - uma metodologia que orienta passo a passo as famílias (homens e mulheres) para identificar barreiras ao progresso econômico e social - muitas vezes ligadas à divisão de trabalho por gênero - e trabalhar juntos para encontrar soluções e construir meios de subsistência mais fortes e diversos. A experiência de Moçambique mostra que a GALS ajuda as famílias a aumentar sua renda, a ter maior igualdade e divisão do trabalho e a uma voz mais forte das mulheres na família e na comunidade. O portfólio também está apoiando Grupos de Poupança e Crédito Comunitário que ajudam 3.000 famílias, principalmente mulheres, a melhorar o planejamento financeiro e a economia das famílias, o que muitas vezes permite manter as crianças na escola ou a adoção de práticas agrícolas sustentáveis.
Portanto, à medida que o COVID-19 continua a trazer incertezas globais e diferente impactos de gênero, relacionados à saúde, educação, atividades econômicas e violência baseada no género, o Portfólio ILM permanece firme em sua capacidade de resposta em matéria de género. Para Amelia, Maria e Amelia, isso significa que elas receberão assistência e orientação ao longo de sua jornada educacional, ajudando-as a planejar o que virá depois da escola. Para o governo local e os parceiros de conservação, significa usar a análise sobre a disparidade de gênero e plano de ação como modelo - sabendo que, ao lidar com a desigualdade de gênero em residências, escolas e comunidades, as chances de conservação da biodiversidade também aumentam.
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