Existem incertezas e equívocos sobre o impacto das tecnologias digitais no futuro do trabalho. Será que os robôs vão substituir os humanos no local de trabalho? Será que as tecnologias digitais irão criar uma nova "fratura digital" e alargar as desigualdades entre as pessoas com uma formação superior e as pessoas com um nível de educação inferior? Serão abertas novas oportunidades para os países africanos criarem empregos, melhorarem os rendimentos, reduzirem a pobreza e subirem na escada do desenvolvimento?
Estas são algumas das perguntas que o nosso novo relatório sobre o Futuro do Trabalho em África aborda. Argumentamos que os países africanos têm potencial para tirar partido das tecnologias digitais de formas diferentes das outras regiões do mundo. No entanto, para aproveitar esta oportunidade de assegurar um futuro melhor para todas as pessoas nos países africanos, deve ser dada prioridade a determinados investimentos. Os governos devem investir em melhores políticas para promover a concorrência, ajudar a desenvolver as competências dos trabalhadores e o espírito empresarial, ajudar a aumentar a produtividade das empresas informais e expandir a proteção social. Isto irá permitir que as empresas façam o que sabem fazer melhor: investir em mais e melhores empregos.
As limitações e promessas das tecnologias digitais na África Subsaariana
As tecnologias digitais estão a perturbar várias indústrias — desde as indústrias transformadoras e serviços financeiros às vendas a retalho e à hotelaria — transformando os modelos de negócio das empresas e remodelando as competências necessárias para executar o trabalho. Pensemos nisso. A Amazon e a Airbnb estão a ultrapassar as empresas tradicionais "reais", como lojas de venda a retalho e hotéis. No entanto, como observa o Relatório de Desenvolvimento do Mundo 2019, as ameaças aos empregos decorrentes da tecnologia são exageradas e não são uniformes em todo o mundo. Embora as economias avançadas estejam a perder postos de trabalho na indústria, o emprego na indústria está a aumentar em partes da Ásia Oriental e está estável noutras.
A África Subsaariana é caraterizada por uma diversidade de desafios que podem parecer fatores limitativos que impedem que a adoção das tecnologias digitais tenham um impacto positivo. Os países africanos têm níveis muito baixos de capital humano para uma população jovem e em rápido crescimento, conforme destacado na Figura 1. Notavelmente, mais de 60 por cento da força de trabalho é composta por adultos mal equipados que necessitam de empregos. A região tem um sector informal particularmente vasto e que é distinto do de outras regiões em desenvolvimento em termos de dimensão e composição. O sector informal representa quase 90 porcento do emprego total, especialmente no sector agrícola. É composto por pequenas e grandes empresas. Por último, os sistemas de proteção social na África Subsaariana são insuficientes e ineficazes. Cerca de 8 em cada 10 africanos não estão cobertos por qualquer rede de segurança social, não estão inscritos num plano de pensões e não estão cobertos por qualquer outro programa de proteção social. As perturbações dos mercados de trabalho provocadas pelas tecnologias digitais, assim como os choques climáticos, a fragilidade, a aceleração da integração económica e as transições demográficas criarão mais necessidades de proteção social.
Figura 1. Na maioria dos países da África Subsaariana, uma grande parte dos adultos com mais de 15 anos é analfabeta
Apesar destes desafios ao desenvolvimento, acreditamos que o futuro do trabalho pode ser brilhante. Como a África tem um menor sector transformador do que outras regiões, a automação não é suscetível de deslocar muitos trabalhadores durante os próximos anos. A maioria das economias africanas ainda tem baixos níveis de procura de produtos que são comuns noutras partes do mundo, como televisores e frigoríficos. Portanto, as reduções dos custos e dos preços decorrentes da adoção das tecnologias são mais suscetíveis de ajudar as empresas a crescer, criar mais empregos e produzir produtos mais acessíveis - na medida em que possam ser feitos por africanos. Finalmente, as tecnologias concebidas para satisfazer as necessidades produtivas dos trabalhadores africanos com uma educação limitada têm o potencial para os ajudar a aprender mais e a ganhar mais. Um estudo recente mostrou que, na sequência da chegada da Internet mais rápida à África Subsaariana no final dos anos 2000 e início dos anos 2010, o aumento da taxa de emprego foi semelhante para os trabalhadores com apenas o ensino primário e para os que tinham um nível de ensino secundário e superior (Figura 2). Esta é uma descoberta otimista. Será necessário obter dados adicionais com base numa gama mais vasta de conjuntos de dados relevantes para disponibilizar informações adequadas para a elaboração de políticas neste domínio.
Figura 2. Um acesso a uma Internet mais rápida levou a um aumento do emprego dos trabalhadores em todos os níveis de ensino nos conjuntos de dados disponíveis
Os investimentos produtivos necessários para assegurar o futuro do trabalho para os africanos
Para colherem os benefícios das tecnologias digitais, os governos africanos, parceiros de desenvolvimento, empresas e outras partes interessadas devem atribuir prioridade aos investimentos em pelo menos três áreas críticas. Em primeiro lugar, os governos devem investir em melhores políticas para desenvolver as competências dos trabalhadores e as relacionadas com o empreendedorismo. Entre outros aspetos, é necessário criar um ambiente empresarial que permita que os inventores e empresários desenvolvam as ferramentas digitais necessárias para aumentar a produtividade, tanto dos trabalhadores pouco qualificados como dos que executam as novas tarefas permitidas pela adoção de novas tecnologias. Isso deverá complementar o aumento dos investimentos na educação na primeira infância e na prestação de serviços de cuidados de saúde.
Em segundo lugar, os governos africanos e outras partes interessadas devem investir na criação de um ambiente de negócios que ajude a aumentar a produtividade e a melhorar as competências das empresas e dos trabalhadores informais. As tecnologias digitais podem ser aproveitadas para este fim, para aumentar o acesso aos mercados, incluindo os mercados da informação, compras de insumos e vendas de produtos e crédito. As políticas públicas que visam alcançar a formalização devem concentrar-se nas maiores empresas informais que competem de uma forma agressiva e que distorcem os incentivos das empresas formais.
Em terceiro lugar, os governos devem aumentar os investimentos públicos para ampliar a cobertura da proteção social. Isto pode ser atingido através da melhoria da cobrança das receitas, utilizando as revisões da despesa pública para justificar a necessidade de reequilibrar as despesas pública para os sistemas de proteção social e de trabalho e para coordenar mais eficazmente a ajuda ao desenvolvimento. Para utilizar da melhor forma os recursos finitos e ultrapassar a resistência política que muitas vezes pode estar associada às redes de segurança social para os pobres, a proteção social deve fazer parte de estratégias económicas nacionais mais amplas sobre empregos e transformação económica, em vez de se traduzir em iniciativas isoladas. Os investimentos em redes de segurança que aumentam a produtividade, como o programa de Proteção Social Adaptativa do Sahel podem ser ligados a uma estratégia mais ampla para fornecer bens públicos regionais numa era de maior integração.
As tecnologias digitais podem ter um papel importante a desempenhar na melhoria do futuro do trabalho em África. No entanto, isso dependerá da realização dos investimentos complementares adequados.
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