Uma escola é como um organismo vivo. Para prosperar, precisa estar saudável e preparada para lidar com enchentes, ondas de calor ou queimadas. Por exemplo, uma escola que sofre com esses fenômenos e tem uma infraestrutura inadequada pode ter dificuldades para motivar seus educadores e estudantes a estar nela e cuidar do local.
A frequência e intensidade dos eventos climáticos extremos aumentaram em 50% nas últimas três décadas. Em 2024, pelo menos 242 milhões de estudantes em 85 países tiveram seus estudos interrompidos por causa desses eventos. Tais interrupções têm consequências graves. Calcula-se que perdas de aprendizagem possam resultar em até 1,5 anos de escolaridade a menos nas regiões mais afetadas.
No Brasil especificamente, os últimos anos viram uma escalada de eventos climáticos extremos afetar diretamente a educação. Inundações, ondas de calor, estiagens e vendavais têm impedido aulas, danificado infraestruturas escolares e comprometido o direito à aprendizagem de milhões de crianças e adolescentes. Devido às enchentes no Rio Grande do Sul em maio de 2024, estima-se que mais de 1 milhão de estudantes tenham ficado sem aulas. Na Amazônia, secas afetaram mais de 420 mil alunos. Os números revelam uma urgência: é preciso tornar as escolas brasileiras mais resilientes às mudanças climáticas.
Um conjunto de novos estudos, desenvolvido em parceria entre o Banco Mundial, o governo do Japão e as secretarias estaduais de Educação do Rio Grande do Sul (SEDUC/RS) e do Mato Grosso (SEDUC/MT), apresenta caminhos concretos para enfrentar esse desafio.
Como identificar as escolas mais vulneráveis em todo território nacional?
O índice GRILO (da definição em inglês Green, Resilient, Inclusive, and Learning-Oriented, ou seja, Sustentável, Resiliente, Inclusiva e Voltada para a Aprendizagem) é uma métrica que avalia as condições para a criação de espaços escolares capazes de promover aprendizagem adequada e enfrentar os desafios ambientais e sociais do século XXI. Ele foi aplicado nas escolas brasileiras para identificar aquelas que precisam de diferentes investimentos prioritários.
A análise do índice revela que estados no Sul e Sudeste, como Santa Catarina e Rio de Janeiro, destacam-se com os melhores índices gerais, refletindo anos de maior investimento em infraestrutura. Em contraste, estados no Norte e Nordeste, como Maranhão e Piauí, enfrentam desafios históricos de subfinanciamento. Além disso, escolas municipais, em especial as rurais, apresentam índices significativamente mais baixos em comparação às escolas estaduais. Esses ambientes com frequência carecem de recursos básicos, como água potável e materiais pedagógicos, prejudicando tanto a resiliência climática quanto a qualidade do aprendizado.
Mapeamento de Riscos Climáticos no Rio Grande do Sul e Mato Grosso
O Mapeamento de Riscos no Rio Grande do Sul analisou 8.629 registros históricos de desastres da defesa civil entre 1991 e 2023 e identificou que desastres naturais como vendavais, chuvas de granizo e inundações têm se intensificado, impactando milhares de escolas e causando interrupções educacionais e prejuízos econômicos significativos. As enchentes de 2024, que causaram o fechamento de 1.148 escolas, prejuízos de cerca de 3,04 bilhões e efeitos sobre a aprendizagem, foram especialmente analisados devido a significativa abrangência dos impactos.
Embora estiagens representem a maior parte dos registros, os desastres hidrológicos e meteorológicos foram identificados como os de maior risco para as escolas. O estudo classificou o risco de 730 escolas de regiões prioritárias para esses dois tipos de desastres, usando indicadores baseados em variáveis como localização, infraestrutura e exposição a eventos climáticos extremos. Municípios como Canoas, Rio Grande e Santa Maria foram identificados como particularmente vulneráveis.
A metodologia de Diagnóstico Rápido (estudo ainda não concluído) também foi aplicada nas escolas do Rio Grande do Sul como resposta aos impactos devastadores das enchentes de 2024, que afetaram 476 cidades, deslocaram mais de meio milhão de pessoas e causaram 183 mortes. O estudo teve como objetivo ajudar a SEDUC/RS a identificar escolas vulneráveis e propor soluções práticas para torná-las mais preparadas para as mudanças do clima.
A análise seguiu as quatro primeiras etapas do guia “Escolas mais Resilientes e Seguras”, que incluem levantamento de dados, políticas de infraestrutura, normas de construção e mecanismos de investimento. Foram mapeadas 9.994 escolas, sendo 730 priorizadas pela SEDUC e 99 avaliadas detalhadamente, com planos de contingência em desenvolvimento para 97 delas.
Os resultados mostram que muitas escolas enfrentam riscos significativos. Por exemplo, 73 escolas têm alta exposição a inundações fluviais e 438 estão em áreas com temperaturas extremas. Além disso, 2.020 escolas estão em zonas com alto risco de seca e 196 em áreas suscetíveis a deslizamentos. A análise também revelou a falta de dados estruturais essenciais, como condição dos prédios e materiais utilizados, dificultando o planejamento de ações eficazes.
A proposta é fortalecer a capacidade técnica da SEDUC/RS, melhorar a coordenação entre instituições e garantir recursos suficientes para construção e manutenção, promovendo ambientes escolares mais seguros e preparados para os desafios climáticos atuais e futuros.
A Avaliação dos Riscos das Escolas de Mato Grosso mostra riscos variados, incluindo inundações, vendavais, ondas de calor e incêndios florestais. O levantamento analisou 1.484 ocorrências entre 1991 e 2022 registradas pela Defesa Civil. Inundações e enxurradas representam 55% dos eventos no estado, enquanto incêndios florestais, estiagens e ondas de calor correspondem a 31%. Vendavais, embora menos frequentes, causaram 41% dos danos às unidades escolares.
A partir de uma análise detalhada de 75 escolas estaduais consideradas vulneráveis, verificou a importância de melhorias na drenagem pluvial e na resistência estrutural das coberturas.
O estudo também identificou a sazonalidade dos principais riscos para auxiliar no planejamento de medidas mitigatórias: chuvas intensas e enxurradas se concentram entre os meses de dezembro e abril, os vendavais entre setembro e novembro, e os incêndios florestais em torno de setembro. Por fim, o estudo categorizou as escolas em três níveis de prioridade com base em fatores como número de alunos matriculados e histórico de danos relacionados a eventos climáticos.
Como aprimorar a resiliência das escolas
Em parceria com a SEDUC/RS, foram elaboradas Diretrizes para Incorporação de Ações de Preparação, Monitoramento e Alertas nos Ambientes Escolares com o objetivo de garantir ambientes de aprendizagem seguros contra eventos climáticos. O processo proposto tem quatro passos principais:
1. Mapear os riscos de eventos climáticos das escolas e as condições dos ambientes de aprendizagem
2. Combinar os riscos com as condições de infraestrutura das escolas para priorizar os investimentos em melhoria
3. De acordo com a priorização, realizar intervenções para aprimorar a resiliência e os ambientes de aprendizagem
4. Desenvolver planos de contingência e realizar treinamentos envolvendo todas as comunidades escolares em um engajamento contínuo para melhoria
A SEDUC/MT está desenvolvendo com apoio técnico do Banco Mundial um Sistema de Gestão da Manutenção da Infraestrutura Escolar (estudo em andamento) com o objetivo de garantir que as escolas públicas tenham ambientes seguros, resilientes, sustentáveis e adequados para o ensino, migrando de uma abordagem reativa de manutenção para uma gestão preventiva e preditiva.
Para isso, recomenda-se a criação de um inventário detalhado dos ativos escolares, o uso de um sistema informatizado para registrar e monitorar manutenções, a adoção de indicadores de desempenho para avaliar custos, riscos e eficiência, e a integração de dados sobre riscos climáticos e sustentabilidade. Também orienta que o sistema seja capaz de apoiar decisões estratégicas, priorizar investimentos, promover a resiliência climática das escolas e garantir a melhoria contínua da infraestrutura, sempre alinhado às normas técnicas e boas práticas internacionais.
Para que as escolas brasileiras sejam verdadeiramente saudáveis, é indispensável que recebam cuidados contínuos e investimentos consistentes — tanto em sua infraestrutura física quanto nas equipes que as mantêm vivas e funcionais. Os estudos desenvolvidos com apoio do Banco Mundial oferecem orientações práticas e acessíveis para que gestores e secretarias de educação fortaleçam esses pilares.
Ao colocar essas recomendações em prática, construiremos um futuro educacional mais resiliente aos impactos da mudança climática, inclusivo em suas relações e eficaz na promoção da aprendizagem.
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