Na pequena comunidade pesqueira de Inhassoro, ao longo da costa central de Moçambique, Eulalia Fernando Baptista passa boa parte do seu tempo vendendo peixe no mercado local e colectando pequenos peixes e mariscos ao longo da costa. Como a maioria das pessoas nas áreas costeiras rurais de Moçambique, a pesca faz parte da vida cotidiana e sua família depende do oceano para sua nutrição e renda. Baptista diz que hoje eles capturam muito menos peixes do que há alguns anos atrás. Com as mudanças climáticas afetando a vida cotidiana e fazendo com que as populações globais de peixes diminuam, comunidades como a de Inhassoro enfrentam a perda de uma parte crítica de seus meios de subsistência. Em todo o mundo, a porcentagem de estoques de pescados feitos de forma insustentável triplicou - de 10% em 1974 para 33,1% em 2015. Quase 60% são pescados no nível máximo sustentável.
Em reconhecimento ao Dia Mundial da Pesca, comemorado 21 de novembro, a equipe do Portfolio de Gestão Integrada de Paisagens de Moçambique (ILM) gostaria de compartilhar como Baptista e sua comunidade estão mitigando e se adaptando a essas ameaças, além de quatro lições que aprendemos sobre como o empoderamento da comunidade e o a co-gestão das áreas de pesca pode mudar a maneira que gerenciamos a pesca local e regional. Isso significa trabalhar com as comunidades locais para criar (ou reviver) os conselhos comunitários de pesca (CCPs) que elaboram e implementam seus próprios planos de gerenciamento de recursos pesqueiros. Essa abordagem dá à população local o controle sobre como suas pescarias são gerenciadas, incluindo a definição de não captura de espécies e o limite sob captura, ao invés de usar a abordagem “top-down” à qual a população local não se sente inclusa nas decisões.
Baptista é membro do CCP local e faz parte dos mais dos 2.700 beneficiários do Projecto de Pesca Artesanal e Mudança Climática de Moçambique (FishCC) - uma iniciativa liderada pelo Governo de Moçambique e que faz parte do Portfolio de Gestão Integrada de Paisagens de Moçambique. Activo entre 2015–2019, o FishCC concentrou-se no fortalecimento da gestão local dos recursos costeiros, apoiando os conselhos de pesca e os pescadores de pequena escala - que atualmente são responsáveis por 85% da captura anual de Moçambique. Uma das maiores realizações do projecto foi apoiar o fortalecimento desses conselhos, demostrando que a co-gestão e o empoderamento das comunidades podem ser o catalisador para o gerenciamento eficaz da pesca sustentável.
O FishCC promoveu a co-gestão, aumentando a conscientização sobre os ecossistemas costeiros locais e o impacto que as ações comunitárias têm sobre a saúde do meio ambiente e os meios de subsistência (especificamente as populações de peixes). O projecto incentivou os pescadores a não usarem os métodos destrutivos de pesca e, em vez disso, se reunirem para elaborarem soluções que ajudam a gerenciar de maneira sustentável os recursos locais.
A abordagem de co-gestão encontrou vários desafios – principalmente a falta de regulamentação para apoiar a participação da comunidade e a fraca coordenação entre as partes interessadas - as lições aprendidas durante o projecto estarão em um relatório completo a ser lançado em breve. À medida em que o Banco Mundial vai introduzindo a co-gestão em mais áreas, através do projeto SWIOFish1-MZ, gostaríamos de partilhar as seguintes lições:
As comunidades pesqueiras precisam de apoio para diversificar os meios de subsistência e aumentar sua resiliência financeira.
É crucial que as comunidades tenham o apoio necessário para manter os meios de subsistência durante a transição da pesca sem restrição, à gestão de recursos controlada pela comunidade. Isso significa ajudar as famílias a garantir sua renda e diversificar os meios de subsistência por meio de iniciativas como os clubes de poupança, concessões e treinamentos vocacionais de carpintaria, eletricidade e costura, por exemplo. Essas actividades complementares não apenas melhoram a segurança financeira, mas também reduzem a pressão sobre os recursos pesqueiros.
O FishCC considerou os clubes de crédito e poupança particularmente bem-sucedidos no trabalho com mulheres e jovens que frequentemente não têm oportunidades de emprego e consideram o mar como seu amortecedor econômico, aumentando ainda mais a pressão sobre os recursos pesqueiros. Para as mulheres, como Baptista, cuja renda depende dos recursos de pesca, os clubes de poupança permitem que os membros aumentem seus activos domésticos e comerciais e economizem dinheiro para despesas relacionadas à educação e saúde. Além disso, esses clubes constroem confiança e coesão social nas comunidades de pescadores que, por sua vez, ajudam a manter a co-gestão após o término do ciclo do projecto.
Confiança e consistência formam a base do envolvimento da comunidade.
O apoio dedicado à extensão e o envolvimento consistente no terreno são cruciais para ganhar a confiança e a vontade da comunidade de se envolver no gerenciamento da pesca. Uma abordagem verdadeiramente popular facilita o consenso na tomada de decisões e na resolução de conflitos e muda a mentalidade na adoção de práticas de pesca mais sustentáveis. Métodos de divulgação de baixo custo, como visitas regulares à comunidade, ferramentas de monitoramento fáceis de usar para registrar informações locais e feedback dos CCPs, e métodos de comunicação envolventes - como visitas a escolas e rádio comunitária - no idioma local, ajudaram a criar confiança na abordagem sobre a co-gestão.
Estruturas legais fortes são fundamentais
As estruturas institucionais e legais devem delinear claramente os procedimentos para o envolvimento da comunidade e o status legal para as áreas de co-gestão. O FishCC constatou que sem essa estrutura formal, foi difícil obter o apoio de autoridades, fazendo com que comunidades em potencial não fossem beneficiadas com o plano de co-gestão.
É essencial uma boa coordenação entre todas as partes interessadas
A coordenação entre agências reguladoras, instituições de pesquisa em pesca, governo local e comunidades deve ser realizada desde o início. É necessária uma forte coordenação em cada passo do processo, desde a identificação dos grupos de reprodução e espécies que precisam de planos de manejo ou reconstrução reforçados até o apoio à capacitação do CCP e a elaboração de planos de co-gestão.
Embora essas lições não sejam exaustivas, elas mostram que a eficácia da co-gestão depende em grande parte da confiança e do conhecimento partilhado, fortes estruturas legais e regulatórias, capacitação, coordenação entre todas as partes interessadas e tomadores de decisão, resiliência financeira e disponibilidade de rendas alternativas.
Em conclusão, para manter ecossistemas marinhos saudáveis, precisamos ouvir e capacitar aqueles que mais dependem da pesca.
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