À medida que os países africanos aceleram a distribuição das vacinas contra a COVID-19 (coronavírus), paira a questão da hesitação em relação à vacina. Globalmente, tem havido um aumento na hesitação geral em relação às vacinas mas especialmente em relação à vacina contra a COVID-19. Em África, a hesitação deve ser vista no contexto de uma escassez significativa de vacinas; a hesitação não explica só por si as baixas taxas de vacinação em África. A lenta implementação no continente é devida a restrições nos abastecimentos, problemas estruturais e barreiras logísticas.
A questão crítica é como aumentar tanto a oferta como a procura. Um inquérito do Africa Centre for Disease Control (Africa CDC) em 2020 em 15 países descobriu que, embora 79% dos inquiridos tenham dito que tomariam uma vacina contra a COVID-19, a hesitação em relação à vacina variava entre 4 a 38% (ver mais estimativas na Figura 1). Num recente inquérito do Afrobarometer feito em cinco países, 6 em cada 10 cidadãos no Benim, Libéria, Níger, Senegal e Togo estavam hesitantes em serem vacinados.
Em África, há múltiplos fatores para a hesitação em relação às vacinas . As preocupação em relação à segurança, efeitos secundários, e eficácia são generalizadas—e foram detetadas entre os trabalhadores da saúde no Zimbabué, Gana, África do Sul, Quénia, Sudão, e Etiópia. O inquérito do Africa CDC indicou que os inquiridos consideravam as vacinas contra a COVID-19 menos seguras e menos eficazes do que outras vacinas e constatações semelhantes foram observadas no Uganda, Serra Leoa, Ruanda, Moçambique, Burkina Faso, Camarões e África do Sul. A suspensão da distribuição da AstraZeneca em alguns países europeus, os dados da África do Sul sobre a sua eficácia e a suspensão temporária da vacina da Johnson & Johnson nos Estados Unidos para avaliar relatos de coágulos sanguíneos, afetaram a confiança em relação à vacinação contra a COVID-19. Por fim, a vacina da AstraZeneca foi recusada por vários países africanos.
O acesso às redes sociais facilitou a difusão da desinformação e das teorias da conspiração. O estudo do CDC, revelou que pessoas com elevados níveis de hesitação tinham maior probabilidade de utilizar as redes sociais e de estarem expostas à desinformação. Metade dos inquiridos na África do Sul acreditava que o vírus estava ligado à tecnologia 5G. Noutro estudo feito na África do Sul, aproximadamente um terço daqueles que recusariam a vacina confiaram nas redes sociais como uma fonte primária de informação. Um pequeno estudo feito em Adis Abeba mostrou que a hesitação era 3,6 vezes maior entre as pessoas que receberam as suas informações através das redes sociais do que aqueles que confiaram na televisão e na rádio.
A confiança no governo do país influencia a tomada da vacina. Na África Ocidental, o Afrobarometer detetou elevados níveis de desconfiança na capacidade do governo em fornecer uma vacina segura. As pessoas que não confiavam nos governos dos seus países tinham uma probabilidade de 5 a 10 vezes menor de quererem ser vacinadas. No Gana, 40% das pessoas que não estavam dispostas a ser vacinadas citam a sua desconfiança em relação ao governo, enquanto na África do Sul, as pessoas que acreditavam que o presidente estava a fazer um bom trabalho tinham mais probabilidades de quererem ser vacinadas.
As crenças religiosas também influenciam a aceitação da vacina. Cerca de 90% dos indivíduos inquiridos no Níger e na Libéria disseram que rezar era mais eficaz do que a vacina. Um recente inquérito da Geopoll em seis países africanos mostrou que as crenças religiosas eram fatores determinantes para a hesitação.
As perceções da magnitude da ameaça colocada pela COVID-19 e o risco de contraí-la influenciam o comportamento. Na RDC e na Costa do Marfim, as pessoas que não acreditavam que a COVID-19 existisse, não viam qualquer razão para serem vacinadas. A aceitação da vacina entre pessoas que conheciam alguém que já tivesse sido infetado pela COVID-19 era 13% superior à das pessoas que não conheciam. No entanto, mesmo quando os inquiridos conheciam alguém que tinha sido infetado pela COVID-19, ainda subestimavam a ameaça representada pelo vírus.
A desconfiança em relação às vacinas desenvolvidas nos países ocidentais não é novidade em África . Está enraizado na história antiética das práticas médicas dos países ocidentais no continente em que os esforços iniciais para abordar as doenças levaram a uma diminuição da confiança na medicina ocidental e levaram a uma subutilização dos serviços de saúde. Aproximadamente 43% dos inquiridos nos 15 países pelo Africa CDC acreditavam que os africanos estavam a ser utilizados como cobaias para os ensaios das vacinas. Foram obtidas conclusões semelhantes na RDC e, num inquérito feito em 2021 em Adis Abeba a hesitação foi associada à crença de que a vacina era uma arma biológica dos países desenvolvidos para controlar o crescimento populacional.
Mas, as perceções em relação às vacinas contra a COVID-19 não são estáticas : é necessária uma recolha repetida de dados utilizando metodologias qualitativas e quantitativas para monitorizar as alterações ao longo do tempo. Entre novembro de 2020 e abril de 2021, o inquérito GeoPoll registou aumentos da hesitação na Nigéria, Quénia, África do Sul, Costa do Marfim e RDC. Em Moçambique, a hesitação diminuiu no final de 2020, mas voltou a aumentar no início de 2021. Enquanto no Gana a hesitação diminuiu de 38% em agosto de 2020, antes da aprovação das vacinas, para 17% em abril de 2021, após a entrega do primeiro lote de vacinas.
Com o aumento do fornecimento de vacinas e a expansão das campanhas de comunicação, estão a ser observadas alterações nos níveis de hesitação. Estas alterações devem ser constantemente monitorizadas para desenvolver estratégias de comunicação consistentes e eficazes que abordem os desafios colocados pelas novas variantes e por mais opiniões divergentes sobre a COVID-19 e as vacinas que continuam a inundar as redes sociais.
Figura 1 – Compilação das estimativas disponíveis para a hesitação em relação à vacina contra a COVID-19 em diferentes países africanos (alguns países têm várias estimativas).
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