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A conectividade na era da pandemia

Photo: © Vincent Tremeau/Banque mondiale Photo: © Vincent Tremeau/Banque mondiale

A conectividade é um bem público: vamos agir de acordo, agora e sempre

Um bilhão e meio. Esse é o número de crianças que agora precisam de aulas on-line devido à pandemia de COVID-19. Enquanto alguns pais se preocupam com a qualidade do ensino que seus filhos vão receber em um mundo que se tornou virtual, o ensino on-line não chega nem a ser um sonho distante para milhões de crianças desconectadas em todo o mundo. Em tempos de distanciamento social, a conectividade é o que nos mantém informados e empregados, além de ajudar a preservar nosso bem‑estar mental e, até mesmo, físico. Para quem não tem acesso à internet, o impacto econômico e social da pandemia será ainda mais desproporcional.

Na luta contra a COVID-19, as tecnologias digitais estão em primeiro plano. Países que não têm infraestrutura para banda larga com amplo acesso estão se preparando para o pior. Pense na África Subsaariana, onde 60% da população continua fora do alcance das redes 4G, ou em países como a Indonésia, onde 2G ainda é o padrão. À medida que a crise se estende e pandemias desse tipo se tornam mais comuns, alguns países ficarão para trás. A implementação de soluções digitais na área da saúde para a detecção da COVID-19 pode salvar vidas. Isso também será importante para proteger os países contra futuras pandemias. Não cabe adotar uma postura complacente: governos, doadores de recursos e o setor de telecomunicações devem fazer todo o possível para conectar os desconectados. Como esta crise sem precedentes tem mostrado, a conectividade é um bem público.

O objetivo de alcançar o acesso universal à banda larga a um custo acessível não deve ser visto como uma utopia. A onda de iniciativas em andamento para ampliar a conectividade em todo o mundo me deixa esperançoso. Nos países mais afetados pela COVID-19, a regulamentação está passando por ajustes para expandir a capacidade da internet. O setor privado está fazendo sua parte. No Quênia, por exemplo, balões de alta altitude que emitem sinais de 4G vão levar a conectividade às áreas rurais após a aprovação acelerada pelo governo da regulamentação desses dispositivos. Em todo o mundo, as empresas de telecomunicações estão aumentando a velocidade e a capacidade da Internet sem nenhum custo extra para o consumidor. No Peru, o órgão regulador de telecomunicações planeja emitir um decreto que proíbe a suspensão dos serviços por falta de pagamento. No Iraque, o Ministério das Telecomunicações proibiu a cobrança de tarifas de roaming nas chamadas de celular e, em Omã, o órgão regulador ampliou as atribuições de espectro.

Demonstrações de solidariedade no contexto de um evento catastrófico são louváveis, mas ficam aquém do que mais precisamos: resiliência digital. Estamos sendo reativos quando deveríamos ter sido proativos. Sabemos que, para superar a divisão digital, será necessário não apenas despender um volume enorme de recursos, mas também mobilizar uma forte coalizão de parceiros comprometidos no longo prazo. Um relatório recente da Comissão de Banda Larga das Nações Unidas estima que cerca de US$ 100 bilhões serão necessários para alcançar o acesso universal à conectividade de banda larga na África. O Grupo Banco Mundial lançou recentemente a iniciativa Economia Digital para África com o ousado objetivo de conectar digitalmente todos os indivíduos, empresas e governos do continente até 2030. Contudo, esta crise tem demonstrado que não podemos nos dar o luxo de esperar.

O que será necessário para alcançar a banda larga universal, acessível e de boa qualidade? Primeiro, e no curto prazo, urge aumentar a largura de banda, administrar congestionamentos para não derrubar a internet e conectar os desconectados. Esses objetivos exigem mudanças na configuração da rede, gestão de tráfego e acesso à capacidade ociosa na infraestrutura para oferecer conectividade a instituições, residências e pequenas e médias empresas. Os serviços públicos dispõem de recursos valiosos, como dutos e postes, prédios, direitos sobre terras e, até mesmo, redes de fibra que poderiam ser aproveitados para implementar, com boa relação custo-benefício, uma nova infraestrutura de banda larga. No caso das operadoras de telecomunicações, o compartilhamento de infraestruturas é o caminho a ser seguido para ampliar a cobertura e reduzir os custos na implementação da rede.

Segundo, precisamos impelir a transformação digital em alguns dos países mais pobres do mundo, aumentando maciçamente os recursos destinados à construção das bases de uma economia digital próspera. Esta crise mostra claramente que os benefícios e oportunidades da tecnologia não estão distribuídos igualmente. Na economia informal, não existe o home office. Nos países pobres, é bem mais comum do que se imagina ver que até empresas mais bem estabelecidas ainda não dispõem da capacidade para passar para operações on-line. Professores, alunos e funcionários públicos precisam de conectividade, mas também de qualificação para usar satisfatoriamente as ferramentas digitais. As economias estão recorrendo cada vez mais às fintechs para se manterem vivas, e a demanda por serviços como pagamentos móveis, entrega de alimentos e comércio eletrônico crescerá exponencialmente.

Agora é o momento de trabalharmos juntos para alcançar a promessa de novas tecnologias para todos e manter o mundo conectado — mesmo em tempos de distanciamento social.

Originally published in Le Monde Afrique.

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Autores

Makhtar Diop

IFC’s Managing Director and Executive Vice President

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